Quando pensamos a respeito do tema patrimônio
cultural somos arremessados para uma concepção sobre monumentos e relacionamos
o valor cultural do bem local apenas às construções em pedra e cal. No entanto,
o Projeto ‘Revelando o Patrimônio’[1]
perpassou por outro conceito de identificação: de sentir-se parte integrante de
uma comunidade específica e assim construir junto ao educando um sentimento de
pertencimento; de descobrir-se parte integrante de algo maior. Assim, difere daquela
perspectiva do patrimônio-monumento e traz para a educação uma prática de
sensibilização para a necessidade de preservar, cuidar e de se apropriar dos
bens locais.
Tive o prazer de acompanhar este
projeto que resgata a história local, trazendo uma proposta pedagógica
multidisciplinar, proporcionando a aprendizagem por meio da pesquisa, colocando
o aluno no papel de pesquisador e produtor de conhecimento.
Este enfoque se instalou na pesquisa na escolha do objeto de estudo e nas
demais etapas de desenvolvimento do trabalho de investigação: pesquisa
bibliográfica, visitas de campo, entrevistas, registros fotográficos,
identificação do problema, conclusão e elaboração de materiais através de
oficinas de fotografias, de escritas dentro de vários gêneros textuais e a
elaboração de um inventário cultural. O aluno-pesquisador foi capaz de gerar
conhecimento e se identificar como parte integrante da história, da cultura e
do ambiente para além dos muros da escola.
Minha formação e experiência
educacional me permite fazer algumas observações sobre este projeto que abordou
aspectos das ciências humanas e da ciência da natureza, pois estabelece
questões que convergem tanto para a educação ambiental como para a educação
patrimonial. Através da abordagem das relações históricas e culturais do
patrimônio a educação ambiental se faz presente, pois dialoga com a identificação
do ser humano enquanto parte integrante da natureza em uma relação de
sustentabilidade, reconhecimento e atribuição de valor. É o conhecer para
preservar.
Uma proposta de resgatar, desde cedo o sentimento
de pertencimento, leva ao apego e conduz a uma sensibilização prévia, capaz de gerar
conscientização e formar um conhecimento consolidado. Revelar o patrimônio ao
educando e propor uma valorização do bem local é fundamental para o seu desenvolvimento,
pois quando se valoriza, luta-se pela conservação e preservação do patrimônio
público, pela cultura, história e tudo que está inserido no ambiente. São ações
locais que acabam por afetar toda uma nação que se inicia em uma localidade.
Esta concepção de jogos de escalas, do local para o global, não é novidade,
pois já foi proposta pela Agenda 21 que teve sua culminância com a segunda
Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, mais
conhecida como Rio-92 ou Eco-92, entre 3 e 14 de junho de 1992 no Rio de Janeiro. No entanto percebemos que este
conceito e sentimento ainda está ausente em grande parte de nossa sociedade.
O patrimônio cultural é uma importante
chave de reconhecimento e proteção de elementos culturais e ambientais das
diversas formas de existir que constituem a memória e os vínculos de identidade
de uma comunidade. Assim, é fundamental que os diversos grupos sociais consigam
olhar para si e descobrir quais são suas referências, práticas culturais e tradições
que os definem como este grupo social se difere dos outros, o que privilegia o
reconhecimento das diferenças socioculturais e o fortalecimento das relações de
alteridade. É a tolerância que também está inserida neste projeto.
Identifico no Projeto Revelando
o Patrimônio a busca pela tomada da consciência ambiental pelo homem, definida
como percepção ambiental. Segundo Ariane Kuhnen (2011, p.250)
A
percepção ambiental esta relacionada ao modo como as pessoas experienciam os
aspectos ambientais presentes em seu entorno, para o que são importantes não
apenas os aspectos físicos, mas também os aspectos sociais, culturais e
históricos. Graças a sua função de interpretação e de construção de
significados, a percepção ambiental exerce papel fundamental nos processos de
apropriação e de identificação dos espaços e ambientes.
A percepção está agregada às sensações,
aos sentidos, memórias, experiências, sentimento de afetos, apropriação e
identidade do local. Tratando-se de ambiente urbano, muitos são os aspectos que, direta ou indiretamente, afetam a grande maioria
dos habitantes – pobreza, criminalidade, poluição, etc. Estes fatores são
relacionados como fontes de insatisfação à vida urbana. Percebemos
manifestações muito comuns de insatisfação da população em geral como o
descaso, o vandalismo, a poluição, ou seja, condutas agressivas em relação aos
elementos físicos e arquitetônicos, normalmente lugares públicos. Talvez, o
hábito da usurpação da coisa pública desde as altas esferas faz com que muitos
cidadãos não sintam que o público é de todos e tenha mais a impressão de que o
público não pertence a ninguém, e tais agressões físicas ao ambiente muitas
vezes acontece pela ausência do sentimento de pertencimento. O desapego
facilita o mal uso, o descaso, a depredação.
Assim, o estudo da percepção ambiental
é de fundamental importância para que possamos compreender melhor as
inter-relações entre o homem e o ambiente, suas expectativas, satisfações e
insatisfações, julgamentos e condutas, como o reconhecimento da importância do
patrimônio cultural local para a preservação da memória e da identidade, além
da identificação das transformações temporais no tocante à ocupação do espaço e
as mudanças na paisagem. Deste modo, conduzir os alunos na valorização do lugar
onde moram, estudam, onde os pais trabalham e está inserida a família é o
começo da luta por uma melhor condição de vida e melhores condições ambientais.
Valorizar e proteger o patrimônio traz para a educação uma oportunidade
transdisciplinar capaz de gerar pontes entre o mundo escolar e seu entorno. É o
reagir local para agir globalmente.
Também preciso ressaltar sobre a
importância de ensinar a pesquisar. O projeto traz esta vertente de uma forma
muito clara e objetiva. A pesquisa, além de ser uma via para a construção do
conhecimento, é base para o progresso humano no mundo científico,
tecnológico e cultural. Assim, a pesquisa intenta formar sujeitos curiosos
acerca do que se passa no mundo e, por meio dessa busca, o conhecimento é
construído pelo próprio educando. Termino esse texto com a frase inspiradora de
Albert Einsten: “A mente que se abre a
uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original.”
BOTINHA, Fabiana S.B.B. A valorização e a importância da pesquisa, do patrimônio e percepção ambiental como instrumento de aprendizagem no cotidiano escolar. Fascículo da Catálogo do Programa Revelando o Patrimônio: revista de artigos pedagógicos. Belo Horizonte: Compreender Consultoria em Responsabilidade Social, p30-31,2018.
[1] Aplicado
aos alunos do Programa Escola Bem Integral de Betim, patrocinado pela empresa
VLI (Valor de Logística Integrado) e desenvolvido pela Compreender Consultoria
em Responsabilidade Social com o apoio da Superintendência da Escola Integral,
na gerência da Superintendente Meirilane Rangel.
Nenhum comentário:
Postar um comentário